VIZUALIZAÇÕES

sexta-feira, 29 de março de 2024

A Vida É uma Escolha pela Verdade

    Eu tentei, mas um mistério tão grande não cabe em poucas linhas...

    Considerando que Deus não pode desdizer o que fala e que as dores são limites, por condicionar a história humana à liberdade das pessoas, Deus sofre. Uma vez que Ele tenha decretado o livre arbítrio dos anjos e dos homens, se o "direito de escolha" for mal utilizado, o sofrimento será permitido. Este é o sentido do "permitir" de Deus: o resultado direto de nossas escolhas. 
    Deus é a verdade, e a verdade não muda. 
  Para invalidar um documento, sem adulterá-lo, é necessário cancelá-lo de forma legítima. 
   A única forma de "rasgar uma palavra", "um edito pronunciado pelo Senhor", é matando-o, do contrário Deus e a palavra dEle não seriam a mesma verdade. Se ambos forem destruídos em uma determinada realidade, a afirmação deixará de existir. Eu disse "em uma determinada realidade" porque existem duas: a realidade carnal e a realidade espiritual (cf. 1a Coríntios 15, 44 ).
   Neste sentido, dizer que "Deus não volta em sua palavra" é inadequado. Ele volta, mas volta ressuscitado, porque se desfaz primeiro, sem trair-se; Ele não elimina uma afirmação dEle sem eliminar a si próprio no mesmo ato. Deus é coerente, é fiel. Tudo o que acontece com "o que foi pronunciado por seus lábios" acontece com Ele também. O Filho é o que o Pai diz, e "o que Pai diz" é literalmente o Filho, no sentido substancial, não em outro menos profundo.
    Por esta razão, "o Verbo se fez carne e habitou entre nós" (1a João 1, 14). Deus precisou entrar nesta realidade de espaço e tempo para morrer e revogar o decreto de morte escrito contra nós. Nós mesmos escrevemos o que nos condena através de nossos atos conscientes de desobediência.
   Uma vez cancelando-se na cruz, Deus não anulou TUDO o que disse. O verbo se fez carne para revogar apenas o "morrerás" registrado em Gênesis 2, 17. 
    A morte, em sentido teológico, é a ausência de Deus, assim como o frio é a ausência de calor. 
    Jesus veio destruir a nossa condenação através da destruição si no Calvário, substituindo o desligamento causado pelo pecado por uma religação (eis a origem etimológica da palavra religião): Sim, Jesus veio ao mundo instituir uma religião. 
    Às outras declarações de Deus não se alteraram, tanto assim que tudo o mais permaneceu igual, as leis da física continuaram intactas, as pessoas e os animais continuaram morrendo, o que mudou, depois da morte de Nosso Senhor, foi o restabelecimento do propósito: sermos filhos adotivos de Deus.
   Este mundo morre por prazo de validade, a condição humana é uma decisão, uma escolha prolongada.
   O exato momento em que aconteceu esta redenção foi na morte de Nosso Senhor. Ao entregar seu Espírito ao Pai, o Pai concedeu o Espírito Santo sem medidas a todos os que creem em Seu Filho! 
   É necessário crer na verdade para ser salvo, pois Deus não nos criou como algoritmos sem capacidade de decisão, Deus não nos criou como animais que buscam apenas o prazer. O objetivo maior não é que tenhamos uma vida melhor, mas que nos transformemos em pessoas melhores, Ele deseja purificar-nos da mentira, pois esta é a razão de estarmos preso neste vale de lágrimas.
    Sem encarar a verdade não há libertação; sem vivê-la não há salvação. Jesus disse: "O pecado consiste em não crer em mim." (João 16, 9). A salvação do Reino da morte é condicionada a abraçarmos a verdade, mesmo quando esta não é compreensível ao nosso limitado conhecimento, lembrando que a mente do Autor e mantenedor da vida é maior do que o planeta Terra, maior do que a nossa galáxia, maior do que o Universo! Enquanto que o nosso cérebro não é maior do que uma bola de basquete...
    O sentido da vida humana é participar da vida divina, "o Filho de Deus se fez homem para nos fazer deuses." (Santo Atanásio); "o Filho Unigênito de Deus, querendo-nos participante de sua divindade, assumiu a nossa natureza para que aquele que se fez homem, dos homens fizesse deuses." (São Tomás de Aquino); "o que Deus pretende é fazer-nos deuses por participação, sendo-o ele por natureza, como o fogo que converte tudo em fogo." (São João da Cruz). Nascemos para ser "deuses com ´d´ minúsculo", não para ser "deuses sem Deus" (cf. Catecismo da Igreja Católica, 398), pois a paz carece de ordem.
    O Senhor permitiu a provação no Éden não para o seu prazer, como se fossemos apenas "bonecos de teste", mas porque "ser provado" é uma consequência do propósito de nossas vidas. Para ter a comunhão com Ele, é necessário reconhecer que Ele é a fonte de todo bem e obedecê-LO até quando não compreendemos a Sua vontade totalmente; é preciso reconhecer que a palavra divina é quem manda, que Jesus é o Senhor do Universo! 
    Não foi Deus quem criou o mal; o mal a é ausência do bem. Ter opção não é um problema, escolher é inseparável à natureza de que somos feitos. Para decidir entre obedecer ou não, necessitávamos da chance de o fazer, só se pode escolher quando se tem duas ou mais opções. Separar-se do bem é a única opção fora dele. Deus é luz e nEle não há treva alguma. (cf. 1ª João 1, 5) 
   Talvez por isso Jesus suou sangue no Horto das Oliveiras... Na Kênosis da Sua Paixão, no seu esvaziamento até a morte para que o documento de condenação escrito contra nós fosse cancelado, Nosso Senhor não poderia falhar; não poderia blasfemar (nem mesmo interiormente), pois "todo o que peca é do demônio." (cf. 1ª João 3, 8). Se a mentira fosse inoculada na verdade, a verdade se implodiria, o universo se desintegraria, nem mesmo o demônio teria existência, nada seria um fato. Verdade corrompida é algo intrinsecamente contraditório; uma "meia-verdade" já é uma mentira. 
    Quando dizemos que Deus esvaziou-se de si ao nos amar até às últimas consequências é sobre isto que estamos falando! Ele nos amou ao ponto de arriscar tudo (inclusive Ele) por nós!
    Mas que amor é esse? 
   Qualquer um beira a loucura ao se aproximar de um amor tão grande assim...
    Penso que esta é a razão de, como humanidade, demorarmos alguns milhares de anos para que chegássemos à plenitude dos tempos e o verbo habitasse entre nós... A capacidade dos seres humanos é pequena demais diante da imensidão que é Deus; é como querer colocar o oceano todo dentro de um copo de água, porém, no essencial, e justamente por ser essencial, é necessário ter um mínimo entendimento para acreditar na verdade, pois a fé nesta é a condição necessária para sermos salvos.
    O documento escrito contra nós foi encravado na cruz (cf. Colossenses 2, 14 ) quando, Aquele que não conheceu o pecado foi feito pecado por nós para que, nele, nos tornássemos justiça de Deus (2ª Coríntios 5, 21). Assim como as palavras de um idioma, por si mesmas, não podem errar, e sim o escritor que se utiliza delas para fins ilícitos, o amor, que não deixa de amar, se faz vulnerável, se deixa ferir, dilacerar, ao permitir que usemos mal a nossa liberdade e escrevamos nossa história de pecados e ingratidões. O amor aceitou que cuspissem em seu rosto, o envergonhassem retirando e repartindo suas vestes, insultassem-no com calúnias, flagelassem suas costas com chicotadas. 
    A palavra imutável de Deus se entregou em nossas mãos, esta mesma palavra pura e sem mancha e dotada de liberdade, como um cordeiro, não abriu a boca ao ser crucificada, ao ser encravada na cruz, deixou vazar seu sangue até a morte, e ao morrer matou o mal uso que fizemos dela, apagou os nossos pecados, perdoou as más ações que praticamos no presente, as ofensas que fizemos ao nome dAquele que É, que cometemos nesta oportunidade de amá-lo chamada "vida".
     Deus nos refaz a cada instante, Ele "sustenta o universo com o poder da sua palavra." (Hebreus 1, 3)

(Gustavo Monteiro Gonçalves - 29/03/2024 - Sexta-feira da Paixão)

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