VIZUALIZAÇÕES

sábado, 5 de junho de 2021

Na pandemia, fique em seu Castelo Interior!

     "Começo minha reflexão, a partir da minha experiência sobre o isolamento social que estamos obrigados a viver, em vista da epidemia do Coronavírus.
     Querendo fazer algo proveitoso nesse período, acredito que a Providência Divina colocou o livro Castelo Interior ou Moradas, de Santa Tereza, em minhas mãos para me lembrar que, além do recolhimento físico no meu apartamento, a vida me chama ao recolhimento espiritual. Este último, é o que ela pede em seu livro, ou seja, o autoconhecimento, tão em voga hoje.
     No livro a santa diz que: “ é desatino pensar que havemos de entrar no céu sem primeiro entrar em nós mesmos (...)”. Para quem não sabe, nesse livro ela ensina às suas filhas espirituais como buscar a perfeição através da oração. Ela diz ainda que é preciso adentrar no nosso castelo interior, que é nada mais nada menos o nosso interior, onde encontraremos com o Rei que habita nele.
     Sabemos também o quanto essa proposta tem sofrido resistência por cada um de nós. O quão é difícil é a perseverança na oração! Por mais que a Igreja e os dirigentes espirituais indiquem-na como remédio e meio eficaz para alcançar a intimidade com Deus, porém, a resistência humana para olhar-se e examinar-se ainda é muito grande. Não queremos parar os nossos afazeres e trabalhos para nos deter no silêncio e contemplação. Mas sabe porque é difícil? Porque a oração não se tornou prioridade ou questão de vida ou morte, pelo menos não é o que parece.
     Confesso que falo a começar de mim. Tudo que está fora de mim, ainda me é muito atraente e chamativo. Mas são notórios os prejuízos que percebo pela ausência desse percurso até o meu castelo interior: não enxergar com mais clareza o que há de precioso, de miserável e misterioso em mim.
     Nesses dias, fui obrigada a experimentar o recolhimento físico, humano e espiritual. Fisicamente, no meu apartamento, fazendo o que normalmente não faço, faxina da casa, lavar banheiro e roupa. As outras tarefas domésticas eu já fazia. Mas tive que sair dos muros do castelo e entrar no ordinário do serviço caseiro, não mais de forma apressada como fazia, pois, antes, tinham outros afazeres mais interessantes e urgentes para fazer fora de casa e que impediam de fazer com mais perfeição e zelo.
     No plano humano, resolvi ligar para todos aqueles que fazia tempo que não falava. Não esperei que ligassem para mim ou perguntassem se eu estava bem, mas busquei as pessoas, antes que elas me procurassem. Daí percebi que não tinha tempo para tristeza, tinha que pensar nos outros.
     Enfim, na dimensão espiritual, além de alguns filmes, me debrucei no livro de Santa Tereza e resolvi começar essa aventura em busca de meu próprio EU. E tudo foi se confirmando. O tempo, que antes era meu inimigo, agora se tornou meu aliado. Não tem desculpa agora. O adágio popular tá valendo: “Não há mal que não traga um bem”. E sabe quais as palavras de Tereza que me estimularam a iniciar essa jornada? Foi essa: “fora deste castelo – tenha certeza – a alma não achará segurança nem paz. Deixe de andar pelas casas alheias.
     Sua própria casa está repleta de bens, se os quiser saborear: onde poderá achar tudo de que precisa como em sua casa? Especialmente tendo tal Hóspede, que lhe dará domínio sobre todas as suas riquezas(...)”. Isso me fez lembrar a frase que tem ecoado em todas as redes sociais: “FIQUE EM CASA POR VOCÊ E PELOS OUTROS”.
     Que coincidência ou providência!! O clamor da humanidade hoje é o mesmo de Santa Tereza a mais de quatrocentos anos atrás: “Haverá maior mal do que não podermos estar em nossa própria casa? Se em nosso lar não acharmos sossego, que esperança teremos de encontrá-lo em casas alheias? ” (Santa Tereza D’Ávila).
     Em meio ao risco do Coronavírus, haverá mal maior do que sair de casa? Não. Assim como haverá mal maior do que não adentrarmos em nós e em nosso castelo interior, como diz a santa? Também não. Então, nesse tempo difícil é preciso buscar os nossos tesouros: nossa família e nossa casa interior. Na casa física, os avós, pais, irmãos, esposo, esposa, filhos, porque são os que mais amamos. Não adianta buscar fora o que só tem em casa. Assim, em tempos de quarentena, não adianta preencher a solidão, a carência, a angústia, o medo de ser contaminado e a falta de paz apenas em redes sociais, mas voltar-se para aquilo pelo qual morreríamos. E se não gosta de estar junto com a família, é melhor começar a mudar a situação, porque no momento é isso que se tem, e, na verdade, você estava precisando enfrentar essa verdade. O outro tesouro é o nosso interior ou castelo, onde está o Cristo, amado de nossa alma. Mas, como em casa tem alguns membros da família que não nos damos bem, mas teremos que enfrentá-los, para chegar ao cômodo do Rei, teremos que enfrentar alguns inimigos indesejados, como medos, a louca da imaginação, temperamento, egoísmo e tudo que nos impedem de chegar aonde a nossa alma mais anseia: o encontro com nós mesmos, que, em certa medida, é o encontro com o Rei.
     Pois bem, se nos esforçarmos na busca desses tesouros durante esse período de provação, podemos evitar um sofrimento sem sentido, porque ao nos voltarmos para aquilo ou para aqueles que tem valor para nós, como aqueles a quem amamos, e, por outro lado, nos desafiando ao encontro com a nossa própria verdade e realidade, elevaremos nossa humanidade e sairemos da mediocridade da vida antes do COVID-19.
     Como vocês, estou lutando para entrar no castelo interior do meu coração. Mas olha, a privação não está sendo ruim, afinal, não estamos sofrendo o que nossos irmãos sofreram nas grandes guerras. Até porque, muita coisa que eu queria fazer e não tinha tanto tempo, estou fazendo, como ler, rezar e escrever esse artigo. E você? O que tem feito? Estamos juntos!" (Gylmara Pereira - Artigo publicado no E-book "Tempos Difíceis", compilado por Rebecca Athayde)

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